sexta-feira, 3 de junho de 2011

Léxico jornalístico, uma diferença entre vida e morte

Já no cursinho me ensinaram a importância da escolha lexical quando se escreve eu um texto. Para quem não sabe isso é só um nome técnico para a escolha das palavras que serão utilizadas. Pois bem, apesar deu ter adquirido esse conhecimento no já ido ano de 2008, é agora como jornalista que vejo explicitamente o poder disso. Explico porquê.


Até antes da revolucionária "Primavera Árabe" (revoluções movidas pelas redes sociais e que depois tiveram apoio da grande imprensa), ninguém na mídia se referia ao ditador Muamar Kadafi como um ditador. Ele era o "presidente" da Líbia. Assim como hoje ninguém se refere a Hu Juntao, "presidente" da China, como ditador. Feita essa comparação, chamo atenção ao fato de que os veículos de comunicação esperaram a população se rebelar contra o "presidente" para declará-lo ditador. Antes não era? Para que a China seja vista como ditadura e, consequentemente, seu líder seja visto como um ditador, é necessário que o governo chinês reprima publicamente sua população que busca direitos exaltados no Ocidente? E já não o fez em 1989 em plena Praça da Paz Celestial? Se ao menos as coisas fossem "Made in Líbia", talvez Kadafi ainda fosse presidente.

Trazendo o problema da mídia em não dar nome aos bois para mais perto, chamo atenção a esta manchete: "Marcha da Maconha é proibida no DF e vira ato por liberdade", que é da Folha Online, mas poderia muito bem ser do Estadão ou do G1. Em uma busca rápida no Google, nota-se que a palavra encontrada nas manchetes é "veto" e "proibição". Quando aparece qualquer derivado da palavra "censura", é justamente assim, entre aspas. Não há um grande veículo que chame essas decisões do Judiciário pelo nome que lhes é correto: censura. Embora pareça simples, ou mesmo tola, essa diferença é crucial para a formação da opinião pública.

Estudos apontam que a maioria dos leitores de notícias lêem apenas a manchete, menos ainda lêem o primeiro parágrafo da matéria, e assim segue essa proporção inversa até se descobrir que somente o autor leu o último parágrafo. Sendo assim, colocar na manchete a palavra "CENSURA" é crucial para se divulgar a ideia de que tais decisões do judiciário são exatamente isso (não precisa nem ser em "caps" e negrito).

A grande implicação dessa troca é trazer a palavra "censura" ao debate sobre o assunto. Essa palavra tem um grande poder no consciente brasileiro e alimentaria o debate público (que, até onde sei, é finalidade do jornalismo). É verdade que radicais de esquerda a utilizam demais e acabaram por banalizá-la, mas, ainda assim, nossa grande imprensa não pode ter medo de deixar o discurso "chapa branca". Ela, assim como os que foram à marcha, tem que se movimentar, sair da sua zona de conforto. Pode até ser que também tome porrada, mas vai se mostrar viva. Porque, enquanto chamar ditador de "presidente" e censura de "proibição", vai continuar perdendo para Twitter e Facebook.